terça-feira, 6 de setembro de 2011

Na Hora do Almoço




Morava perto do trabalho. Almoçaria em casa na segunda vazia. Mais: derrubaria a marmita do almoço de domingo-pais. O transporte na cidade açoita, mas ele vencia pagando aluguel caro. Caminhou dez minutos, elevador, porta, cozinha. Esquentou a lasanha e a carne no micro-ondas e ligou a tevê - não gostava de comer sozinho. Colocou no canal de filmes para afagar um pequeno orgulho: sempre descobria o final do filme. Roteiros são tão previsíveis como a vida, se empinava. Enquanto o molho de tomate quente escorregava pelo degraus da massa, uma mulher paria. A mãe chorava e quase morria, segundo os médicos. Enquanto isso o pai (irmão? Não, tinha certeza que era o pai) fugia da polícia. Mastigava a carne – deliciosa – e o pai tomava três tiros em frente a parede branca, fazendo arte com espirros de sangue. O filho nasceu molhadinho de vermelho quando ele garfou o último pedaço de lasanha. Limpou o prato, jogou na pia, jorrou água pra não grudar. Na volta lavava. Suspirou no sofá. A mãe morreu mesmo. O homem não era o pai. Errara. O filme tinha aqueles roteiros que entrelaçam distâncias, como em Babel. Subiram os créditos. A preguiça coçou, mas decidido matou a tevê. Disparou um ar pesado. Porta, elevador, dez minutos, trabalho.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário